“[…] O Ângelo era daqueles seres raríssimos sem ego. Nada a esconder, nada a defender ou preservar, uma imagem social, um estatuto, uma carreira, uma psicologia. Quando falava, trazia a vertigem consigo. A vertigem da ausência de ego que alastrava para o exterior, os outros, abanando as leis dos hábitos, das convenções e da estupidez. Não suportava a estupidez e a grosseria. […] Tinha horror à “pose” cultural, à seriedade hipócrita das convenções, ao discurso sábio “intelectual” – e à interioridade que se finge possuir para parecer profundo. […]
Porque não tinha ego era um ser livre. Porque era livre – das pessoas mais livres que conheci – era imprevisível: não surgia nunca onde o julgavam apanhar. Porque era imprevisível tinha a afectividade nascente e poderosa das crianças. A sua potência vital. Por isso da sua obra jorra o júbilo único de existir – como uma cor para uma criança, como um movimento que faz existir uma coisa. […]”
José Gil (excertos do texto lido no funeral de Ângelo de Sousa, publicado no Público de 4 de Abril).
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