É um dos grandes intelectuais europeus da actualidade,
um eterno candidato ao Nobel da Literatura. O escritor italiano Claudio Magris,
de 74 anos, venceu o primeiro Prémio Europeu Helena Vaz da Silva para a
divulgação do Património Cultural, instituído pela Europa Nostra, em parceria
com o Centro Nacional de Cultura e o Clube Português de Imprensa.
À hora em que o prémio foi este domingo anunciado,
Claudio Magris, ensaísta especializado nos grandes dilemas da Europa, autor de obras tão conhecidas e aplaudidas pela crítica
como Danúbio (Dom Quixote), passeava-se (e passeia) pelo
alto mar. Mas não partiu para longe do mundo que tanto analisa sem antes ter
deixado uma mensagem de agradecimento por mais uma distinção.
Numa carta endereçada ao júri, presidido por Guilherme
d’Oliveira Martins (presidente do Centro Nacional de Cultura), Claudio Magris
expressou a “mais profunda gratidão por este grande, generoso e totalmente
inesperado reconhecimento”, que, acrescenta. “chega de um país que sempre
esteve presente na minha fantasia, nos meus interesses, no meu imaginário”.
“Não sou um lusitanista e infelizmente não falo
português, mas a história, a civilização e a literatura desse pequeno grande
país sempre desempenharam para mim um importante papel, sempre me estiveram
presentes.” E continua, na nota enviada ao PÚBLICO: “Talvez porque se trata de
uma enorme civilização de mar, elemento essencial da minha sensibilidade e do
meu ser, de um pequeno país que se tornou num império do mundo – no mais lato
sentido do termo e não só no político – e como poucos outros foi um teatro de
encontro, e como sempre também de confronto, em suma, um palco de protagonismo
no grande teatro do mundo”.
A ligação do escritor italiano a Portugal há muito
tempo que é conhecida. Em 2011, Claudio Magris assinou até o prefácio da
reedição da Caminho de A Viagem a Portugal, de José Saramago. Magris
lembrou no prefácio que, quando se encontrou pela primeira vez com Saramago em
Lisboa, foi este o livro que o Nobel da Literatura lhe ofereceu.
Nascido em Trieste em 1939, Claudio Magris tem uma extensa obra dedicada ao ensaio, ao romance e ao
relato de viagens. O italiano é ainda professor de literatura alemã
e tradutor, colaborando ainda com regularidade para o jornal italiano Corriere
della Sera. Como diz ao PÚBLICO Guilherme d’Oliveira Martins, “além de um
grande escritor, Claudio Magris é um homem da comunicação”.
O prémio agora entregue a Magris pretende anualmente
distinguir um cidadão europeu que, ao longo da sua carreira, se tenha
distinguido pela sua actividade de divulgação, defesa e promoção do património
cultural europeu através de obras literárias, artigos, crónicas, fotos, séries
documentais, filmes e programas de rádio e/ou de televisão publicados ou emitidos
nos diversos meios de comunicação.
É por isso que, para Guilherme d’Oliveira Martins,
“faz todo o sentido premiar Claudio Magris nesta primeira edição”. “É um
escritor com uma noção de património que não se projecta apenas no passado como
se estende ao presente. Tem uma escrita plural, tolerante e promotora de uma
cultura europeia”, diz ao PÚBLICO o presidente do júri, composto por Antonio
Foscari, Francisco Pinto Balsemão, Irina Subotic, João David Nunes, José María
Ballester e Piet Jaspaert.
No comunicado, o júri destaca exactamente o
conhecimento que Claudio Magris tem da Europa “enquanto espaço de diálogo e de
intercâmbio cultural é muito perceptível, especialmente na sua obra sobre o
Danúbio", cujo tema principal é uma incursão e um pretexto para
explorar e dissertar sobre a cultura centro-europeia, "mas igualmente em
toda a sua rica produção literária”.
“Através dos seus textos tem contribuído para a tolerância e a paz europeia. Magris é alguém
que tem reflectido ao longo da vida sobre os temas de identidade como factores
de entendimento, valores tão importantes nos dias de hoje”, acrescenta ainda ao
Guilherme d’Oliveira Martins, que em Outubro entregará o prémio no valor de dez
mil euros ao escritor italiano numa cerimónia que vai acontecer na Fundação
Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Sendo a Europa um dos temas sobre os quais mais se
debruça, Claudio Magris foi um dos intelectuais que no início do ano assinou o
manifesto internacional chamado Europa ou o caos. Uma denúncia do
vertiginoso crescimento do "cinismo", "chauvinismo" e
populismo" e que começava por dizer que “a Europa não está em crise, está
a morrer”.
“Não a Europa como território, naturalmente. A Europa
como Ideia. A Europa como um sonho e um projecto”, diz o início do texto
assinado ainda pelo escritor português António Lobo Antunes, Bernard-Henri Lévy
(autor francês), Vassilis Alexakis (escritor grego), Juan Luis Cebrián
(jornalista espanhol e fundador do El País), Umberto Eco (intelectual
italiano), Salman Rushdie (romancista indiano), Fernando Savater (filósofo
espanhol), Peter Schneider (romancista alemão), Hans Christoph Buch (jornalista
e autor alemão), Julia Kristeva (filósofa búlgaro-francesa) e Gÿorgy Konrád
(ensaísta húngaro).
(Artigo da autoria de Cláudia Carvalho, publicado no site do jornal Público)
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